CHRISTINA ENCONTRA SUA VOZ. A diva pop conta tudo sobre a queda da topo e como ela está cantando pelo caminho de volta.
Quando Christina Aguilera tinha 6 anos de idade, ela escapava do caos e trauma familiar pensando em Julie Andrews, enquanto cantava a trilha de “A Noviça Rebelde”. “Eu via ela correndo naquelas montanhas, tão livre”, Aguilera lembra quando fala do terrível ano em que figurou nos tabloides pelo divórcio, letras esquecidas, queda em televisão nacional, descanso na cama errada, e, finalmente, triunfo. “Eu me senti engaiolada na minha infância. E insegura. Coisas ruins aconteciam na minha casa, e violência. A Novia Rebelde se tornou uma forma de liberação. Eu abria a janela do meu quarto para cantar como ela. Do meu jeitinho, era como se eu também estivesse naquela colina”.
Aguilera pausa. Ela é pequena, e enquanto falava, era quase engolida por um imenso sofá do saguão do salão do Hotel Mandarin Oriental, onde ela estava hospedada. Aguilera parecia mais “Oliver” do que “von Trapp”, vestida em um grande sweater cinza e leggins pretas; o cabelo amarelo chamativo estava quase todo escondido em um boné virado de lado. A pela era clara e ela não estava usando o peculiar batom vermelho mas, cedendo um pouco à feminilidade, usava altíssimos saltos em plataforma. “Às vezes”, Aguilera continua, “especialmente nesses últimos seis meses, eu ainda me sinto como quando cantava todos os meus problemas pela janela”. Ela olha para baixo, ri baixinho, e balança um pouco a cabeça. “Eu tenho rido muito ultimamente. As pessoas esperam que eu chore, mas eu sempre rio quando as coisas são errado”.
Para Aguilera, de 30 anos, as coisas começaram a dar bem errado por volta de junho de 2010, quando o álbum Bionic foi lançado. Apesar dela ter vendido mais de 30 milhões de álbuns, ganhado 4 Grammy Awards e ser uma estrela desde os 12 anos, quando apareceu no Clube do Mickey (ao lado de Justin Timberlake e da ex-melhor amiga Britney Spears), o público de Aguilera não correspondeu à fusão de Bionic em batidas hip-hop, ritmos disco e vocais não-melódicos. Não havia nenhum hino como Beautiful, a canção-assinatura de Aguilera, uma balada de 2002 que fala direto ao pássaro orgulhoso mas ferido dentro de cada um de nós. Ao invés disso, Bionic adentrou um novo território: o som cheio de elementos tecno não usou a maior força de Aguilera, os vocais flutuantes e multioitavos. No lugar, ela pareceu mais preocupada em soar contemporânea a clássica. “É um desvio artístico”, escreveu Jon Pareles sobre Bionic no The New York Times. Ele não aceitou a tentativa de Aguilera em se reinventar, descrevendo a nova encarnação como “uma garota gostosa sussurando convites sobre batidas de boate”.
Apesar de Aguilera ter dominado o nicho de estrela pop pequena-garota-com-grandiosa-voz, com Bionic, ela entrou no território de Lady Gaga. Na imprensa, ela fingiu não perceber ou notas. “A novata?”, Aguilera uma vez disse a um jornalista, quando questionada sobre Gaga. “Essa pessoa me foi apresentada há pouco tempo. Não sei bem quem é, para ser honesta. Não sei se é homem ou mulher”. Apesar das frágeis confusões quando ao gênero de Gaga e a estranha resistência em dar crédito a ela, o clipe de “Not Myself Tonight”, primeiro single de Bionic, era bem semelhante com o sucesso “Bad Romance”, de Gaga. Quadro a quadro S&M, eles combinavam. Fãs antigos de Aguilera não se intrigaram pela nova identidade, e não surgiram novos fãs. Enquanto o álbum declinava, a turnê de 20 datas não vendeu e foi cancelada, ao custo de milhões de dólares. Surgiram boatos de que a gravadora queria dispensá-la do contrato. As coisas não andavam bem.
Em outubro de 2010, o declínio de verdade começou: Aguilera anunciou que ela estava deixando o marido Jordan Bratman após 5 anos de casamento, com quem ela teve o filho de três anos de idade, Max. O casamento parecia acalmar Aguilera – em artigos, ela se gabava da vida sexual com o marido, dizendo que eles gostavam de andar sem roupas na mansão em Beverly Hills. “Uma hora ou outra”, Aguilera me disse, dando a impressão de traição por ambos os lados, “nenhum de nós dois éramos santos. Chegou uma hora que nossa vida em casa estava me lembrando a minha infância. Eu não quero meu filho crescendo em um lar cheio de tensão. Eu sabia que a imprensa reagiria negativamente ao meu divórcio, mas eu não vou viver minha vida de acordo com o que podem dizer de mim. Isso é contra tudo o que eu canto nos meus álbuns. Eu tenho que ser eu mesma.
Logo se tornou claro que Aguilera se apaixonou por outro homem – Matt Rutler, um musicista/assistente de produção de 25 anos de idade. O casal se conheceu no set de Burlesque, o primeiro filme de Aguilera, lançado no feriado de ações de graça. O filme parecia montado sob encomenda para Aguilera: a história de uma talentosa e deslumbrada jovem que escapa do passado abusivo em uma pequena cidade americana para buscar fama em um bar de Los Angeles. Se você transforma a protagonista de vinta-e-poucos-anos em uma criança, teria a carreira de Aguilera: ela começou a cantar na primeira série, e aos 13 anos já tinha um contrato. Aos 19, tinha um álbum de platina e rodava o mundo em turnê. “Eu era como uma bala que acabara de sair de uma arma”, ela me disse.
De todas as maneiras, Burlesque tinha um set tumultuado: Steve Antin, diretor estreante, e Clint Culpepper, o chefe do estúdio, eram namorados de longa data que se desentenderam e quase se destruíram com o filme. As brigas eram altas, constantes e geralmente físicas. Durante uma discussão, Culpepper supostamente jogou chá gelado na cabeça de Antin.
“Tinha muita energia negativa no filme”, Aguilera se lembra. “E foi difícil ser o centro daquilo tudo. Muito estava influenciando no longa, e eu tive que por um fim. Tipo, ‘Ei, parem de brigar – isso é minha carreira”.
Burlesque, que custou US$ 55 milhões, não provou ser um antídoto para Bionic: o filme tropeçou nas bilheterias. Apesar de ser raro uma estrela pop ter sucesso em musicais (para cada Diana Ross em Lady Sings The Blues tem uma Mariah Carey em Glitter), Burlesque foi decepcionante para Aguilera. “Eu fiquei triste, mas ainda assim gostei de ter feito o filme”, ela disse. “Durante a produção, eu estava passando por um período de auto-descoberta. Como uma popstar, você tem sua equipe com você o tempo todo. Quando entra e sai de algum lugar, bastidores, até em casa – você sempre tem seu time do seu lado. No set de filmagens, não tinha ninguém do meu lado. E eu me senti bem. Quando eu conheci meu primeiro marido, precisava daquela mão para tomar as rédeas e cuidar de mim. Depois do filme, deixei de ser aquela garota um pouco. Me tornei mais adulta.”
E ainda assim, quando perguntei a Aguilera o que a atraiu em Rutler, ela respondeu, “Eu posso depender dele para tudo. Matt estava trabalhando no filme, e me deu muito apoio. Ainda me dá. Nós enfrentamos muita coisa no último ano”. Rutler, que raramente sai do lado de Aguilera, é belo, garotão e educado, e também tem sido uma forma de amuleto de má-sorte – no último ano, quando ele a acompanha em grandes eventos, as coisas parecem ir terrivelmente errado. Em fevereiro, o casal foi junto ao Super Bowl em Dallas, onde Aguilera cantaria o hino americano antes do jogo. Quando era um fenômeno infantil, ela cantava o hino uma dúzia de vezes para os times locais – os Penguins (hockey), Pirates (baseball) e Steelers (football). “Tudo no campo do Super Bowl era muito claro, e eu acabei tendo um momento”, Aguilera relembra. “Eu me perdi na emoção de estar lá e errei a letra da música”. Ao invés de cantar “O’er the ramparts we watch’d were so gallantly streaming,” ela soltou “What so proudly we watched at the twilight’s last reaming.”
O improviso se tornou notícia instantaneamente. “Eu sabia que a imprensa explodiria com isso”, ela disse. “Eu e Matt saímos para jantar depois do Super Bowl e rimos sobre como eu me transformei em uma daquelas cartas de perguntas e respostas. ‘Em 2011, que cantora errou a letra do hino americano?’”.
A maré de má-sorte seguiu um incidente bizarro que havia acontecido algumas semanas antes, quando Rutler e Aguilera foram à festa de aniversário do ator Jeremy Renner, na casa dele. “Matt era o convidado – eu fui como namorada dele”, Aguilera conta. “Era uma festa aberta, e todo mundo estava espalhado pela casa inteira. Em um determinado momento, eu sentei no canto de uma cama, no quarto de hóspedes. Mas só precisa de uma pessoa para espalhar a negatividade, e então, todo mundo que embarcar na onda e continuar a história. A história, segundo Renner, era que Aguilera tinha subido na cama dele. Ele insinuou que ela estava bêbada, ou louca, ou os dois.
Dúvidas sobre sua sobriedade e a influência negativa de Rutler chegaram ao ápice quando, em fevereiro, Aguilera tropeçou e quase caiu durante um tributo à Aretha Franklin, no Grammy. Foram muitos inexplicáveis e surpreendentes incidentes. As pessoas imaginaram que ela estava bêbada, desabando ou em necessidade urgente de uma intervenção. “Eu sei o que todo mundo estava comentando”, Aguilera me disse. “No Grammy, quando eu quase caí, pensei ‘Tá brincando comigo?’. Eu sempre me dei bem nos meus saltos. Até grávida, eu me apresentava em saltos. Anotei pra mim mesma que nunca mais usarei um vestido daquele. Meu salto agarrou no pano de dentro do vestido, e se não fosse por Jennifer Hudson, que me segurou, eu teria caído com tudo no chão”. Quando aconteceu, ela pensou, “O que mais falta, meu Deus? O que mais?”. Eu joguei a mão para cima e comecei a sorrir, porque, o que mais podia dar errado?”.
Bem… menos de um mês depois, no meio dos boatos de mau comportamento no Grammy e algumas especulações compreensíveis sobre porque ela estava se tornando uma famosa problemática, Aguilera e Rutler saíram para jantar no Osteria Mozza em West Hollywood, um de seus restaurantes favoritos. Eles estavam celebrando a finalização do contrato para participar de The Voice, uma competição no estilo American Idol que coloca todos os tipos de cantores contra o outro. The Voice, que é baseado em um sucesso holandês, tem um ponto diferencial. Os jurados – Aguilera, Adam Levine da banda Maroon 5, a estrela country Blake Shelton e Cee Lo Green, um cantor de R&B, sentam em imensas cadeiras de costas para o palco. Sem ver, eles não podem se deixar influenciar pelo visual ou movimentos dos aspirantes a famosos – e as decisões são tomadas tão somente pela voz. Se os mentores gostam do que ouviram, eles apertam um botão e as cadeiras se voltam para o palco. Cada profissional escolhe 8 cantores para treinar. Enquanto a temporada caminha, os cantores competem um contra o outro em uma batalha de músicas, e o vencedor será coroado A Voz.
“Eu nunca assisti a um capítulo inteiro de American Idol”, Aguilera disse, explicando porque não queria participar de The Voice. “É muita maldade. Porque alguém iria a um programa para ser criticado daquele jeito? Eu não quero ser cruel com meus cantores, mas eu quero deixar claro para eles em The Voice que, se você quer mesmo isso, vai ser chutado quando estiver no chão. Você tem que saber lidar com esses chutes. Você tem que querer muito isso”. Como uma ambiciosa criança aos 9 anos, Aguilera competiu no Star Search, cantando Sunday Kind Of Love. Ela perdeu nas semifinais. “Alguém pelo menos se lembra para quem eu perdi?”, ela brinca. “Naquela idade, eu sempre cantei músicas feitas para pessoas mais velhas. Isso combinava com minha personalidade – eu tinha dores para cantar. Se existisse um programa como The Voice, eu participaria. Seria incrível ser treinado por um mentor”. iloveaguilera.wordpress.com
Aguilera também deve ter percebido que esse programa seria bom para a carreira em quedas. Foi inteligente: The Voice lembra ao público o que ela sabe fazer de melhor, que é cantar. Os mentores cantam e também mostram ser pessoas calmas, sãs, apaixonadas e experientes. Essas características faltavam no perfil recente de Christina.
Empolgada por The Voice, ela e Rutler estavam se sentindo otimistas. Voltando para casa do jantar celebrativo em 1º de março, Rutler, que estava ”dirigindo erraticamente” às 2:45 da manhã, foi parado. Alegadamente, ele estava bêbado, apesar de que posteriormente foi revelado que o nível de álcool no sangue era 0.6, bem abaixo do limite legal de 0.8 na Califórnia. Apesar disso, a polícia prendeu Rutler e Aguilera, que, segundo eles, estava “extremamente bêbada”. Os dois foram fichados, fotografados e colocados na cadeia durante a noite. Por pior que tenha sido esse incidente, o final foi positivo: o caso contra Rutler foi finalizado por insuficiência de evidências.
“Não deveria nem ter acontecido”, Aguilera me diz. “A polícia sabia minha história recente e quis entrar na onda. Eu não quero parecer a coitadinha, mas acredito ter sido vítima de celebridade. Eu não dirijo, não estava dirigindo, não cometi crime nenhum, e ainda assim me colocaram na prisão. Eles falaram que eu era uma ‘batata quente política’. Disseram, ‘o que vamos fazer com ela?’. Acho que estavam entediados”.
Aguilera pausou. Oito semanas depois da prisão falsa, The Voice estreou com número altíssimos, abocanhando 11.8 milhões de telespectadores. A audiência aumentou no episódio seguinte, o torando o mais assistido programa entre adultos de 18 a 49 anos – a mais cobiçada faixa etária da televisão. O sucesso de The Voice aquietou muitos críticos de Aguilera e deu um final feliz a um ano de problemas.
E ainda assim, as falhas de Aguilera e comportamento extremo foram boas para a carreira dela. A narrativa de uma estrela pop tem que ser acompanhada de intrigas e revés de sorte. America gosta que seus ícones – especialmente aqueles como Aguilera, que cresceram na frente do público e são famosos há anos – sejam tanto queridos quanto prontos para aparecer nos tabloides. É uma extensão estranha do complexo-Madonna reescrito para a cultura de celebridades: estrelas devem ser puros fenômenos que nunca envelhecem ou revelam suas imperfeições, mas também devem ser provocantes o suficiente para alimentar o público incansável e obcecado pela mídia. Sem quebra-molas nas estradas ou algum tipo de drama pessoal, é fácil esquecer uma popstar. É por isso, por exemplo, que os certinhos Jonas Brothers foram substituídos pelo certinho Justin Bieber. Se Bieber não for preso logo, vai ser substituído por Greyson Chance, mais novo a ser descoberto.
De Sinatra a Elvis a Madonna a Aguilera, o estrelato é um ato de equilíbrio entre luz e escuridão. Ao contrário de atores e atrizes que são definidos pelos papeis que interpretam (escritos para eles), estrelas pop devem se reinventar. Devem aceitar a ajuda dos empresários, produtores, publicistas e estilistas para moldar uma identidade, mas o relacionamento entre o cantor e o público (Gaga e os monstros) é mais direto que de um ator. Para alguém como Aguilera, talento é importante, mas a noção de que a fascinação americana com a personalidade, queda e redenção, é crucial para uma carreira longa. Cair no Grammy pode ter sido a melhor coisa a acontecer com Aguilera. Isso é, desde que ela se levante.
“Eu realmente admiro todos os grandes”, Aguilera disse. “Eles tiveram seus altos e baixos durante as carreiras. E eu nunca vou abaixo sem lutar. Ainda tenho meus olhos no prêmio: quero ser aquela velha senhora mexendo o quadril no palco e cantando os maiores sucessos”.
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